Intervenção: Empreendedorismo
Fomento à cultura empreendedora e inovação

Síntese das revisões sobre “Fomento à cultura empreendedora e inovação” e apontamento de lacunas de pesquisa

O fomento à cultura empreendedora e à inovação consiste em um conjunto de políticas, práticas e iniciativas voltadas para estimular a adoção de uma mentalidade empreendedora e promover a capacidade de inovar tanto em ambientes empresariais quanto no setor público (Neto et al., 2022; Aragão et al., 2021; Mendonça et al., 2023).

Isso transcende a criação de novos negócios, abrangendo a formação de um ecossistema em que a criatividade, o risco calculado e a capacidade de identificar e explorar oportunidades são valorizados como motores de desenvolvimento econômico e social (Pacheco et al., 2021; Campigotto-Sandri et al., 2020).

Há um consenso entre os trabalhos consultados sobre a definição de “empreendedorismo inovador”. Nesse caso, é aquele que se destaca pela criação de novos produtos, serviços, métodos de produção ou modelos de negócios. Utilizando novas tecnologias em mercados estabelecidos, contribui para o aumento da produtividade econômica e competitividade.

Outra forma de empreendedorismo inovador envolve inovações de processos ou desenvolvimento de novas tecnologias, gerando vantagens competitivas nas organizações, sendo conhecido como empreendedorismo corporativo. Este se baseia na inovação empresarial e na governança do conhecimento como recurso privado por meio de atividades empreendedoras. Dessa forma, a conceituação de empreendedorismo inovador relaciona o indivíduo empreendedor, os negócios, o conhecimento e o contexto social e econômico, formando um sistema de inovação.

Vários autores argumentam que o empreendedorismo não se restringe à atividade de iniciar uma empresa, mas se manifesta como uma cultura que pode transformar a dinâmica dos mercados de trabalho (Bezerra; Rocha, 2019; Ratinho et al., 2020; Melo et al., 2020). Nesse sentido, o fomento à cultura empreendedora busca incutir valores e atitudes que permitam aos indivíduos se posicionarem de forma proativa diante dos desafios contemporâneos (Garcez; Franco; Silva, 2023; Hernández-Sánchez, Sánchez-García; Mayens, 2019).

Essas competências são especialmente relevantes num cenário de rápidas transformações tecnológicas e de mudanças nos modelos de produção, onde a adaptabilidade e a criatividade se tornam essenciais para a competitividade (Pecly; Ribeiro, 2020; Nwosu et al., 2023).

No contexto das políticas públicas, a promoção de uma cultura empreendedora é vista como estratégica para enfrentar problemas como o desemprego e a informalidade, contribuindo para a inclusão social e a geração de empregos de qualidade (Paliwal et al., 2023; De Brito; Leitão, 2020). Relatórios internacionais, como os da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e estudos do Banco Mundial, evidenciam que países que investem em educação empreendedora e em programas de inovação apresentam maiores índices de empregabilidade e crescimento econômico sustentável (Schimperna; Nappo; Marsigalia, 2022; Mamabolo; Myres, 2020).

A importância do fomento à cultura empreendedora e à inovação reside, portanto, na sua capacidade de promover a transformação dos mercados de trabalho. Ao estimular a criatividade e a iniciativa individual, essas políticas ampliam as possibilidades de geração de emprego, reduzem a dependência de modelos de trabalho tradicionais e fortalecem a capacidade dos indivíduos de se adaptarem a ambientes econômicos voláteis.

Em outras palavras, o fomento à cultura empreendedora e à inovação é visto, pela literatura, como um elemento-chave para a modernização dos mercados de trabalho contemporâneos. Representa não apenas um estímulo para a criação de novos negócios, mas também um instrumento de transformação social por meio da promoção de competências inovadoras e da integração entre diversos setores.

No entanto, a literatura nacional citada na página anterior argumenta que, no Brasil, iniciativas como programas de capacitação em empreendedorismo e de incentivo à inovação têm sido implementadas, mas ainda enfrentam desafios relacionados à integração entre os setores público e privado, à adaptação dos modelos internacionais à realidade local e à necessidade de políticas que contemplem as desigualdades regionais e sociais.

Esses estudos sugerem que as lacunas no fomento à cultura empreendedora e inovação incluem a necessidade de entender melhor o papel das atitudes culturais, desenvolver competências empreendedoras, integrar o empreendedorismo no currículo educacional, e criar ambientes competitivos e colaborativos que superem barreiras regulatórias e financeiras.

De fato, no apontamento das lacunas que precisam ser abordadas para aprimorar a eficácia das políticas públicas nesse campo, enfatiza-se uma escassez de investigações que mensurem de forma sistemática os impactos dessas políticas em termos de empregabilidade e desenvolvimento econômico. Muitos trabalhos se concentram na definição e nos benefícios teóricos do empreendedorismo, mas faltam dados empíricos longitudinais que demonstrem a evolução das competências empreendedoras ao longo do tempo.

Além disso, a integração entre os diferentes atores envolvidos – setor público, privado e instituições educacionais – é frequentemente tratada de forma fragmentada na literatura. Aponta-se que, embora a colaboração entre essas esferas seja considerada crucial para o sucesso dos programas, há poucas análises que exploram como essa articulação pode ser operacionalizada de forma efetiva, especialmente em realidades heterogêneas como a brasileira.

Outra lacuna importante refere-se à adaptação dos modelos de fomento à cultura empreendedora aos contextos regionais e culturais específicos. Enquanto a literatura internacional apresenta diversos modelos de sucesso em países desenvolvidos, há uma carência de estudos que investiguem como esses modelos podem ser ajustados para atender às peculiaridades do Brasil, onde as desigualdades sociais e regionais impõem desafios adicionais. Essa adaptação requer uma abordagem inter/transdisciplinar que combine elementos da teoria do empreendedorismo com perspectivas socioculturais e econômicas locais.

Por fim, a sustentabilidade e replicabilidade dos programas de inovação e empreendedorismo também aparecem como áreas pouco exploradas. Poucas revisões sistemáticas discutem quais estratégias se mostram mais eficazes na promoção de uma cultura empreendedora robusta a longo prazo, considerando não apenas a criação de novas empresas, mas também o desenvolvimento de um ecossistema que possibilite a permanência e o crescimento dos empreendimentos. Essa lacuna impede a transferência de boas práticas e a formulação de políticas públicas que consigam gerar um impacto duradouro no mercado de trabalho.

Em resumo, as principais lacunas sobre o assunto “fomento à cultura empreendedora e inovação”, incluem a necessidade de avaliações longitudinais e empíricas dos impactos das políticas; a integração efetiva entre os setores público, privado e educacional; a adaptação dos modelos internacionais às realidades locais e o estudo da sustentabilidade e replicabilidade das iniciativas de fomento.

Referências

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